Recebida a incumbência de escrever a história da família Borges, me senti o homem mais feliz do mundo e ao mesmo tempo preocupado por saber que não darei conta de tão grata oportunidade.
Seu João Borges, cujo nome completo era João Borges da Costa, foi escravo de ganho de Ludugero Aleixo da Cunha Porto. Com a libertação dos escravos, por intermédio da Lei 3353 de 13 de maio de 1888, segundo informações orais, Ludugero aleixo da Cunha Porto, fez uma doação a seu João Borges, o sítio Barrocas, e para outro escravo, cujo nome era Adelino, o Sitio Bandeira. Seu João Borges, com seu trabalho fez um grande roçado, plantou palma e criou muito gado. Teve boas condições financeiras, porém a crise de 1930 lhe causou grandes prejuízos.
Seu João Borges era, segundo informações orais de nossos antepassados, o responsável pela cozinha. Sabia fazer queijo de manteiga e outros tipos de comida que agradou até o cangaceiro Antonio Silvino. Ouvi muitas vezes ele contar que foi requisitado pelo cangaceiro para fazer a comida da tropa nas cercanias de Santa Maria do Cambucá quando Antonio Silvino a atacou.
Ele se casou com dona Joana, que parece ter nascido em Serra Verde, mas que tinha família em Gravata do Ibiapina. O Casal teve muitos filhos, apesar de dona Joana ter morrido cedo. Hoje, com apenas dados da vivência com a família Borges, não lembro ao certo quantos e nem o nome de todos. mas Deixo para Geraldinho a tarefa de completar a árvore genealógica da família Borges. Eram seus filhos: dona Maria Borges, que não se casou, mas assumiu o lugar de mãe com a viuvez de seu pai. Dona Maria era uma figura que todo mundo respeitava. Severino Borges da Costa, que morou nas Barrocas por algum tempo, mas teve como moradia definitiva a vila de Riacho de Santo Antonio. Teve muitos filhos. Abílio Borges da Costa, que pouco se sabe sobre ele, pois ao que parece morreu quando ainda era jovem. Seu Pedro Borges da Costa; que casou com d Maria, cuja família era de Gravata do Ibiapina, e teve os seguintes filhos: Margarida que deve morar em São Paulo, Amaro, que se ainda viver deve morar no município de Barra de São Miguel, Antonio que mora também no nordeste e nosso querido Assis que já é falecido. Todos os filhos de seu Pedro deixaram descendentes. Seu Alfredo Borges da Costa que, foi durante muitos anos, vaqueiro da fazenda Maniçoba, cujo dono se chamava Jofre. Seu Alfredo se casou com d. Dora que pertencia à família Pacas da Situação. Este maravilhoso casal teve os seguintes filhos, João,Aristom Maria e Ana. Uma curiosidade: a casa de seu Alfredo ficava muito distante da minha, mas à noite, quando se abria as janelas podia-se de ver a luz dos candeeiros de ambas.
Também teve sua filha d. Antonia, que se casou com seu Artur Constância,cuja família era do Bonsucesso, na Paraíba. D Antonia e seu Artur tiveram um filho, nosso querido Adeval, que se casou com Julieta e teve muitos filhos que devem residir na nossa querida vila do Jerimum. Teve também José Borges, o pai do grande vaqueiro Odílio, que morava também na vila do Jerimum. o único vaqueiro que pegou o boi Mulatinho. Teve seu João Borges e dona Joana, outros filhos como seu Luiz que foi militar da Marinha e deixou filhos na cidade de Duque de Caxias no Rio de Janeiro. Seu Raimundo que era casado com dona Diolinda e que tiveram os seguintes filhos, Margarida, que se casou com Miguel, que morava no Riacho de Santo Antonio, João, e Inacinha esposa de nosso amigo Biroca, filho de seu Bernadino do Bandeira, Déda, que também morava em riacho de Santo Antonio, Eminergídio,que morreu jovem,Inácio figura muito popular e querido Por todos.
Dos filhos de seu João Borges, só resta vivo seu Nestor que se casou com tia Lieta, Maria Lieta de Farias e tiveram os seguintes filhos, Antonio Nestor da Costa, que é militar aposentado e um grande vaqueiro, Graciete que mora no nordeste e teve dois filhos. Geni que mora na vila de Jerimum e tem filhos, Aluisio Nestor da Costa que mora no Estado de Minas Gerais e nosso saudoso Amaro Nestor da Costa que também deixou uma filha. Tio Nestor quando se casou foi morar no sítio Barreira Vermelha, no município de Vertentes e em seguida se transferiu para a fazenda Riachão, de propriedade de Abílio Pedrosa e por volta de 1963, mudou-se para as Barrocas e, hoje, mora na Barra de São Miguel. Considero tio Nestor meu segundo pai.
Seu Euclides Borges da Costa. Falar de tio Euclides, enche meus olhos d água. Ele se casou com dona Tereza e teve os seguintes filhos: Jose, João, Maria, Severina, Margarida, Amara e Bento. Tio Euclides morou inicialmente na fazenda das varginhas, perto de Pão de Açúcar. Ele era um eximo caçador e também um grande amestrador de animais, quase todas as noites nós íamos à manga de seu Ângelo para caçar. Seus cachorros: Possi, Jacaré e Peixinho.Possi morreu de velho e era o melhor; jacaré era magro, mas muito caçador também. Quanto a Peixinho não posso falar nada, pois na primeira noite que fui caçar ele desapareceu e nunca mais voltou. Deve estar perdido na fazendo Açude Novo, onde foi visto pela última vez. Nosso parceiro de caçada era seu Amaro Inácio, uma das lendas de nossa terra.Euclides era muito respeitado na região por ser um homem honesto simpático e que procurava fazer amizades com todos,também era um grande contador de histórias,e todas as noites se reunia com os irmãos na casa onde nasceu para prosiar,Euclides,Nestor, Amaro,Pedro e Silvia contavam histórias que deichava os garotos de boca aberta a ouvir,garotos como Geraldinho, Djalma, Claudio, Dedé,Eugenio, Eraldo ,Evaldo Everaldo e Bento filho de Geraldo Barbosa davam gargalhadas infinitas e depois saiam comentando no caminho de volta para casa.Seu Euclides era muito servidor, e no possível ajudava a todos que o procurava seu Euclides nasceu em 07/07/1914 e faleceu em 01/12/1996 dona Tereza Maria de Jesus,nasceu em 06/06/1916 e faleceu em 08/07/1988.
Por último, deixei para escrever sobre a filha Severina Borges da Costa. Tia Silvia, foi professora de toda uma geração. Ela educou muitas crianças. Tia Silva, pelo pouco que conheço só tinha um defeito: era muito namoradeira. Suas únicas paixões foram Zezé João e Amaro Clementino, um de Pedra Preta e outro de Serra Verde. Tia Silva foi aluna de Maria Porto. As aulas de tia Silva foram muito importantes para nós. Ela não fazia chamada. E como o prefeito nem sabia que ela existia nada lhe pagava. Às vezes seu Amaro Borges ia à Barra de São Miguel e trazia alguns trocados como salário. Professora como tia Silva nunca mais nascerá. Uma vez ela deu férias a seus alunos, mas esqueceu de combinar com o prefeito, que certo dia mandou um fiscal fiscalizar tia Silva. Seu Amaro Borges montou num jumento e foi de porta em porta buscar os alunos para no dia determinado comparecer à escola, para que a fiscal fiscalizasse. A dita fiscal chegou, olhou para os estudantes e mandou que se retirassem. Em seguida, cobrou a lista de presença. Não existia lista de presença nenhuma e a fiscal ao invés de lhe agradecer pelos serviços prestados lhe disse em tom de autoridade: “Só não lhe demito porque encontrei a sala cheia de meninos e meninas. É, nosso País, desde aquele tempo já tratava bem nossa educação.
Por último seu Amaro que se casou e foi morar no Sul de Pernambuco. Teve muitos filhos, como Antonio Borges uma figura folclórica que valorizava muito o espiritismo,seu Amaro depois que ficou viúvo voltou para as Barrocas e lá viveu até seus últimos dias conosco. Era, uma figura maravilhosa. Galanteador, namorador, mas não se casou depois de viúvo. Gostava de fumar um cigarro de palha e tomar café. Seu jumento, companheiro inseparável, ás vezes magro, às vezes gordo lhe levara para todos os lugares. Ia a todas as missas de Serra dos Bois e só se sentava na cadeira da frente, bem perto do padre. Era o primeiro a receber a comunhão, os filho de seu João Borges da costa foram dezesseis, treze homens, e três mulheres.
Seu João Borges era canhoto. E uma vez um menino que também nascera canhoto, mas foi forçado a ficar destro, numa bela tarde, após apanhar um saco de algodão, sua avó lhe levou à casa de seu João Borges. Chegando lá, a cozinha estava cheia de filhos. O Patriarca sentou-se à cabeça da mesa, muito feliz com a presença de parte de seus filhos e de sua comadre predileta, a avó do menino. O menino, ao ver seu João Borges, pegar a colher com a mão esquerda e levá-la à boca, teve uma alegria enorme. Chegando a casa de sua família, achando que estava abafando, logo disse para sua mãe:- Mãe, seu João Borges come com a mão esquerda, logo eu também posso comer,
Naquele tempo esse menino já estava com más intenções e parece que já tinha lido o Discurso do Método quando dizia se existo eu penso. A sua mãe na ponta da língua lhe respondeu:
- Seu João Borges pode comer com a mão esquerda, pois ele é o chefe da casa.
Para se chegar às Barrocas tinha-se que passar pelo corredor de seu Amaro França. Este corredor era famoso, pois lá apareciam almas. Seu João Borges, dizia que uma sexta-feira, a meia noite, quando passava em frente àquela pedra que ficava próxima à cacimba de Luiz França,uma freira estava sentada lá. Muito calmamente, quem sabe esperando o dia clarear para ir apanhar algodão no roçado dos franças.
Uma tarde estava nas Barrocas e depois de tomar café com tio Nestor resolvi passar pela casa de seu João Borges. Fui muito bem recebido por tia Silva e tomei mais café. Enquanto conversávamos, avistamos uma menina correndo. Era uma carreira que dizia que àquela criatura precisava de muita ajuda. E que ajuda. Essa menina era filha de Maria de seu Bau. Seu Bau era vaqueiro de Chico Elói. Ele tinha três filhos, João, Maria e Luzinete. Luzinete era a mulher mais linda que já passou por àquela fazenda. A Maria não se via, nunca. Ela teve um filho e ficou solteira. Acontece que um caçador de Tanque Raso passando pela fazenda lhe caçou e a levou para morar num rancho nas Barrocas. Maria criava muitos cachorros e, como todos sabem tais animais só comem angu quando sobra. Parece que não sobrava nada, lá. A menina pedia que fôssemos lhe ajudar porque todos os cães estavam loucos. Eu, Bento e tio Euclides corremos. Chegando lá, constatamos que os animais soltavam espuma pela boca e pelas narinas.Tio Euclides de espingarda foi matando um a um. Só que ao final ele me disse:
- Antonio, a loucura destes animais é fome. E era mesmo.
Durante muitos anos fui à casa de seu João Borges de segunda à sexta-feira. E sempre era bem recebido. Seu João, ou padim João, como era carinhosamente chamado pelos seus netos e netas sabia que mais ou menos ao meio dia as crianças cantavam o Hino Nacional. Ele, esperto como nunca, saia bem devagarzinho do roçado, com sua enxada nas costas e chegando em casa ficava em pé, próxima à sala só para ouvir as crianças praticando o seu compromisso para com a Pátria.
Hoje, as Barrocas deve se encontrar dividida entre seus herdeiros, o que é natural. Afinal o direito à propriedade e à herança estão amparados pela nossa Constituição. Só que também a Carta Magna assegura que a cultura é patrimônio nacional e a casa de seu João Borges deve ser preservada e tombada como patrimônio histórico de nossa geração. Preservar a casa de seu João Borges é preservar a memória de uma família que viveu em paz com todos e a qual merece todo respeito e carinho. Preservar a história dos Borges da Costa é fazer a história.
Por: Antônio Martins de Farias, colaboração de Geraldo Filho.
O casal Euclides e Teresa, e os netos José Jorge, e Rejane
Casa de seu João Borges um pouco reformada
Uma parte original, lado esquerdo da casa em (Taipa)
Foto atual de Amara filha de Euclides Borges
Amara Carinhosa mais jovem
Severina Borges, Tia Silvia
O velho Pilão de dona Joana resiste ao tempo
As ruínas do velho Grupo escolar das Barrocas
O velho armazém de seu Euclides, ou dispensa.