segunda-feira, 21 de julho de 2014

A casa de Mãe Zita




Nos primórdios de vida fui levado por minha vó, Otília, a conhecer Mãe Zita. Chegando a sua casa, entrei pela porta da cozinha, pois a da frende se encontrava fechada. Parece ser um costume: manter a porta da frente das casas fechada. Ao penetrar na cozinha dei de cara com uma velhinha de cabelos brancos. Ela estava sentada num banquinho escolhendo feijão. Quando me viu fez uma festa: parecia que me esperava. Em seguida, pôs-me no colo e fez uma brincadeira que até hoje me lembro: pegou minha mão, contou os dedos assim: dedo de medinho, seu vizinho, maior que todos..., passou pelo braço indo até o “sovaco”. Cadê o queijo que deixei aqui? O rato comeu! Não respondi, pois não sabia qual queijo ela se referia, afinal não tinha ganhado nenhum até aquele momento.
Mãe Zita, após as brincadeiras comigo voltou-se às tarefas que estava fazendo e, logo em seguida, passou a fazer “bico”, que consistia em um trabalho artesanal, de muita importância para a época.
Lembro-me ainda de Mãe Zita andando por dentro de casa. Só depois de algum tempo ela sofreu uma queda e ficou muitos anos acamada, sempre acompanhada de suas filhas: tia Zefinha e tia Lina, que moravam com ela. Importante ressaltar que toda família corria à casa de Mãe Zinta, para curtir sua presença inesquecível e reconquistar energia e vitalidade. A casa  de Mãe Zita uma espécie de oráculo: lá se obtinha a sabedoria que nos faltava. 
Eu também gostava de dormir lá para, pela manhã, comer pinha no roçado de tia Zefinha.
Todas as noites, depois da ceia de angu com leite, às vezes com rapadura, rezávamos o terço. O que demorava era a ladainha. Ou reza cumprida! Muitas vezes não esperava o fim e dormia só para minha vó, com todo carinho me pegar no colo e me levar para dormir na rede.
Quando o dia amanhecia ia com tia Lina para os tanques e pegar as primeiras latas d’água. Ainda com o sol brando ela aproveitava para apanhar um pouco de algodão ou então extrair alguns cachos de mamona para vender e com dinheiro mandar celebrar missa em intenção das almas do Purgatório.
Na casa de Mae Zita, além do banco que me referi acima também tinha um Santuário com muitos santos, inclusive uma imagem de Santa Luzia, que pertencia ao meu avô Ananias Idelfonso de Queiroz, além de outros objetos de valor histórico inquestionável.
Mas tudo isso se perdeu. E também a casa de Mãe Zita, não existe mais. A culpa pela sua destruição é de todos nós. É pena que não se possa preservar a história dos fundadores e desbravadores de Serra dos Bois.


Antonio Martins de Farias é Advogado e filho de Taquaritinga do Norte.