A Jumenta que Não
Morreu
Houve épocas
que em Serra dos Bois os jumentos tinham donos. Na década de 60, uma jumenta,
cujo proprietário era Theobaldo, foi dada como morta, pois em numa tarde de sol
escaldante, a dita cuja foi encontrada, já em trabalho de parto; com os urubus comendo
sua cria e arranhando com seus bicos malditos a pobre mãe. O local da tragédia
foi a lagoa de seu Oliveira, como ficou conhecida após o fazendeiro de Surubim
adquirir, em leilão, a Terra das Noventa. Noventa porque sua extensão mede
noventa braças de largura; e faz divisa com as Barrocas, e, com a serra do
Jerimum, ou Serra dos Aleixos. Não sabemos de quem era a Terra das Noventa, nem
o porquê de sua arrematação. Seu Oliveira, fazendeiro, rico de Surubim, a
arrematou e depois de muitos anos a vendeu para Otávio Ramos. Neste interregno
as Noventa era uma terra sem dono. Muitas benfeitorias ficaram dentro das
Noventa, por exemplo, a casa de tio Manoel Ludugero e seus barreiros, uma parte
do roçado de tio Abdias, que logo de encarregou de entregar ao seu dono. A
capoeira, onde hoje é o açude. Lá existia um pé de cajueiro, cujos cajus eram
muitos saborosos. Existia também um pé de bonome, do qual saiam gostosas
sementes, com as quais os meninos se alimentavam, ou enganavam a fome.
A tragédia
levou o dono da jumenta a vendê-la para um morador de Frei Miguelinho. Este
morador a tratou como devia e a dita jumenta de renovou. Teve vários filhos e
um muito especial. Este jumento recebeu o nome de Borrego, por ter a cor de uma
ovelha. Seu dono foi um apaixonado por ele. Borrego era tudo para seu
proprietário. Borrego recebia um tratamento privilegiado, ou seja, era mais bem
tratado dos que os outros jegues, especialmente os de seu João Cazé.
A jumenta
preta, como nós a chamávamos todas as vezes que dava uma cria e seu dono queria
que ela apartasse, ou melhor, parasse de amamentar seu filho a levava para
Serra dos Bois. Enquanto ela não esquecia seu filho, chorava e sofria muito.
Certa vez foi levada para o Sertão, lá com saudade da cria, abriu a porteira e
fugiu. Não pode, no entanto, abrir uma porteira no caminho e teve que se
embrenhar pelas terras de um rico fazendeiro. Muito tempo depois foi encontrada
por um vaqueiro famoso e novamente voltou para Serra dos Bois e depois retornou
para Frei Miguelinho, onde morreu de velha e seus ossos foram guardados, com
todo carinho em cima de um pé de bonome para a eternidade. Assim, jumenta de
Theobaldo não morreu, continua viva na memória de muita gente.
Por: Antonio Martins