terça-feira, 24 de janeiro de 2012

As Novenas


Havia um hábito de se rezar em Serra dos Bois. Tia Zefinha sempre chamava Padre Otto para celebrar missas na casa de Mãe Zita. Embora, antes disso, ocorreu um assassinato no sítio Mares, município de São João do Cariri. A vítima chamava-se Manoel Farias, nosso parente distante. O assassino era de uma família muito conhecida pelo epíteto ou apelido do “quitia”, cuja origem deste nome parece ser de um pássaro africano. A história desta tragédia é a seguinte. O Sr. Manoel Farias, que era um homem muito rico, resolveu cercar a cacimba que os “quitias” davam água à suas vaquinhas, das quais tiravam o sustento e um pouco de leite para alimentar seus filhos. O algoz, aflito, tocaiou o Senhor Farias e o assassinou. Preso e julgado foi levado à cadeia de Campina Grande. Na cadeia, o homem simples que nem nome tinha, aprendeu a fazer artesanato e quando meu avô Ananias foi lhe fazer uma visita ganhou um Santo Antônio, cuja imagem se encontra dentro de uma garrava. A pergunta que todos fazemos é: como aquele homem fez uma arte tão simples e tão bela?
Com esta imagem nos acostumamos, desde pequenos, ser devotos de Santo Antônio. E todo dia 12 de junho se rezava uma novena casa de tio Otília, como chamavam minha vó. Também se rezava na casa de Otávio Ramos. Ficávamos esperando os fogos de lá. Quando se tinha certeza de a novena de Otávio tinha começado, começava-se a rezar a nossa. Meu avô trazia fogos. Era uma festa e ao mesmo tempo um transtorno. É que com o barulho dos fogos o cachorro latia; a vaca mugia e quebrava a porteira e os bezerros entravam para o curral e no dia seguinte não tinha leite para as crianças. Era bonito ver os fogos de lágrimas nos céus. As novenas podem não ser mais rezadas, mas dão saudades. Depois da novena, iniciava-se a festa profana: tomava-se café, comia-se bolo e falava-se da vida alheia. Muitas vezes se fazíamos adivinhações e a brincadeira da bacia, onde se punha uma brasa dentro d’água e se não se conseguia ver tal brasa acesa, naquele ano se morria. Eu acreditava e acredito, pois para Deus nada é impossível.
            Assava-se batata doce e milho na brasa da fogueira. Só no dia seguinte é que se comia a canjica. Quanto às pamonhas comia-se assim que elas saiam das panelas. A meninada se divertia lambendo a palha. Sempre sobrava um pedaço da coisa mais gostosa do mundo - pamonha. O trágico era que à noite estávamos todos com o bucho inchado.
Passava-se um bom tempo carregando facheiro seco para fazermos a fogueira de Santo Antônio, São João de São Pedro. Assim as novenas ficaram na minha lembrança e na de muita gente também.

Antonio Martins de Farias

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