Uma bela índia
nasceu nos arredores da fazenda Açude Novo. Nasceu como uma deusa. Para alguns
ela trazia características de Iracema, de José de Alencar. Seus pais, aos
poucos, foram se adaptando aos costumes de Serra dos Bois. A índia crescia e
com ela crescia também um jeito de sapeca de ser e de se comportar. Ita era seu
nome. A menina aprendeu a dançar assim que deu seus primeiros passos no chão de
terra batida, em sua aconchegante casa de taipa que ocupava as margens do Olho D’água,
nas proximidades da Serra Lavrada.
Ita cresceu. Acostumada
a andar a cavalo corria nua, como Eva no Jardim do Éden, após comer a fruta
proibida. A índia cavalgava pelas capoeiras de seu Oliveira. Ia à Lagoa das
Gogoias. Em algumas ocasiões visitava a fazenda de seu Agnelo Pedrosa. De vez
em quando ia até à fazenda Maniçoba, para um café, na companhia dos vaqueiros. Em
suas andanças pelos marmeleiros, quando o sol estava abrasivo, Ita desmontava
de seu tordilho, chamado de “filho do vento”, em razão ser o mais rápido cavalo
da região. e descansava à sombra das quixabeiras, que embelezavam as margens do
Riacho da Tapera. Dependendo da hora, Ita até tirava uma soneca, quando sonhava
com seu príncipe encantado. Quando o sol quebrava e já caminhava para o ocaso a
jovem sonhadora montava em seu cavalo e retornava à casa de seus pais, às
margens do riacho do Olho D’água, dentro dos limites da fazenda de seu
Oliveira.
Ao terminar o
dia os concrizes, os galos-de-campina e as juritis faziam a festa. Quando era noite
de lua cheia Ita ficava à janela, olhando a beleza dos galhos de avelós bravo, as
macambiras, os lastrados e os mandacarus em flores, trazendo para o sertão os
primeiros sinais de chuva. Só por volta da meia note é que Ita ia dormir em uma
cama de vara, mas que ela fez um dos lugares mais confortáveis que o mundo
conheceu.
Curioso é que
Ita andava nua pelos campos e, em Serra dos Bois, ninguém percebia tal fenômeno.
Fato é que ela fizera amizade com o escravo Lulu, morador da casa de taipa que
ficava no caminho da casa de tio Aleixo Porto. A casa de taipa e cercada de
árvores, quando até hoje lá aparece almas penadas. O escravo Lulu criava cobras
e, por certo, fora o único mandingueiro de Serra dos Bois. Assim, por dedicação
e amor à Ita, Lulu fez um trabalho mágico afim de que quando Ita andasse como
veio ao mundo ninguém a percebesse. Por mais bem feito que tenha sido o
trabalho, um rapaz sabia que Ita andava montada em seu tordilho, pelas
capoeiras, sem nenhuma tira de pano em seu corpo.
Com sua
beleza, com o rosto tão belo; com seu cabelo lindo como o ninho da casaca de
couro, Ita, por destino, foi se apaixonar logo pelo rapaz de Serra dos Bois, que
conseguia lhe ver nua andando pelos matos. Também, por obra do destino, tal rapaz
não correspondeu à a paixão ardente da índia.
Ita
decepcionada com a falta de sorte e por não ter sido correspondida resolveu se
vingar e, por este tempo, conheceu um cangaceiro do grupo de Antonio Silvino,
que se hospedava na casa de Ludugero Aleixo da Cunha Porto. Apesar de amar
intensamente o filho da terra e não recebendo apoio de seus pais para se casar
com o cangaceiro, Ita fugiu e nunca mais se teve noticia de nossa índia,
ficando todos sem saber por onde anda Ita. Fato é que Ita era tão bela que parece
que sumiu para virar pedra e enfeitar a Serra Lavrada.
Por:Antonio Martins de farias: